"25/08/2023 Em parceria com o Correio Braziliense, FNCP realizou um seminário nesta semana para discutir como a reforma pode frear o fortalecimento do contrabando no país "
Até o final do ano, o Brasil deve ter uma Reforma Tributária aprovada e pronta para entrar em vigor em 2024. Debater um novo modelo dos tributos pagos pelas empresas e os consumidores é fundamental porque tem impacto direto no combate ao mercado ilegal. Nesta semana, o Fórum Nacional contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP), em parceria com o jornal Correio Braziliense, promoveu um seminário reunindo parlamentares, economistas e especialistas para discutir ideias e propostas sobre como mudar o cenário do contrabando no país, que gerou um prejuízo de R$ 410 bilhões aos cofres públicos em 2022.
O grande receio é que a reforma venha acompanhada de um aumento de impostos para algumas categorias da indústria brasileira. O presidente do FNCP, Edson Vismona, alertou que, caso os preços aumentem ainda mais, cresce “a vantagem competitiva do produto ilegal”.
“Precisamos discutir e avaliar qual vai ser o impacto da reforma tributária, se essa reforma vai resultar em aumento da carga tributária e de quanto será esse aumento. Porque, se houver, nós estamos entregando o mercado, em alguns segmentos, claramente, para o contrabandista, para quem opera na ilegalidade”, afirmou Vismona.
Sem aumentos de impostos
Parlamentares presentes no evento garantiram que o projeto deve ser aprovado no Senado sem aumento de carga. O relator da Reforma Tributária na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) explicou que o projeto de criação do IVA, o Imposto sobre Valor Agregado, foi planejado para que garanta as alíquotas do presente e deixe espaço para uma redução no futuro.
“Construímos um IVA que garante a simplificação tributária. Deixamos um controle dentro do texto de alíquota para que não suba a carga tributária. Nosso compromisso foi de não aumentar a carga tributária”, disse.
No Senado, quem coordena o grupo de trabalho da reforma é o senador Efraim Fillho (União-PB), que citou que a Reforma Tributária tem um potencial para trocar a chave do “perde-perde”, em que a alta carga tributária no país afeta a arrecadação das empresas, para um cenário de “ganha-ganha”, sem aumento de impostos e com o crescimento de recursos para os cofres públicos.
Efraim Filho também admitiu que os “impostos do pecado”, que oneram com uma taxa extra produtos como cigarro e bebidas, tiveram o efeito contrário do esperado – incentivando o contrabando.
“O contrabando é um jogo de perde-perde. Ele deteriora o mercado de trabalho formal. Gera a evasão de divisas. Incentiva a sonegação fiscal. Gera riscos à saúde e à integridade do consumidor. Piora o ambiente de negócios. Coíbe e inibe a atração de investimentos”, ponderou o senador durante o evento em Brasília.
Já o advogado tributarista Luiz Gustavo Bichara contrapôs o cenário apresentado pelos parlamentares de “neutralidade tributária” e disse que é preciso que o Congresso apresente garantias para que a promessa dos parlamentares seja cumprida. “Essa neutralidade não está escrita em lugar nenhum. É um mito, uma quimera. Um mantra que se repete a toda hora”, criticou. “Até essa virada, os entes estão livres para fixarem o tributo que bem entenderem. Essa neutralidade deveria constar no texto da reforma”, alertou Bichara.
Diferenciação Tributária
Uma das ideias trazidas ao debate foi pontuada pelo presidente do FNCP, Edson Vismona. Implementar uma diferenciação tarifária de impostos para marcas populares de cigarros brasileiros – uma das indústrias que mais sofrem com o contrabando atualmente. Isso geraria mais competitividade frente ao mercado ilegal e diminuiria as perdas do setor, que cresceram mais de 300% nos últimos nove anos.
“Nós reduziríamos o espaço de competitividade do contrabando de cigarros no Brasil e, com isso, aumentaremos a arrecadação e a segurança do consumidor, que teria acesso a um produto regulado, que atende às normas da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária)”, explicou. “E também diminuímos o espaço das organizações criminosas que operam no contrabando de cigarros, e das milícias. O que o senador (Efraim) falou é o ganha-ganha, uma proposta importantíssima e inovadora, que ajudaria a combater o contrabando, que é a nossa missão”, explicou Vismona.
O impacto da alta tributação
Para os especialistas que participaram do seminário há uma relação clara entre a alta carga de impostos no Brasil e a preferência do consumidor pela compra de produtos ilegais e contrabandeados.
O economista Pery Shikida explicou aos parlamentares e convidados o conceito da elasticidade, quando o aumento da tributação em produtos como o cigarro tem o efeito inverso: reduz o consumo legal do produto, o governo arrecada menos e, por consequência, abre portas para o comércio clandestino do cigarro, já que o consumidor tende a fazer a opção pelo produto de menor preço.
“O Paraguai consome apenas 3% dos cigarros e exporta legalmente apenas 2%. O resto é contrabandeado no Brasil. São 65 bilhões de cigarros contrabandeados sem pagar impostos e com um efeito perverso para toda a sociedade”, destacou Shikida.
Também convidado para o debate, Roni Peterson, auditor-fiscal da Receita Federal, pontuou que este cenário de vantagem do contrabando no país freia a indústria no desenvolvimento de novas tecnologias no mercado nacional.
“Desenvolver um novo produto e uma nova tecnologia custa caro. Custa tempo, esforços, oportunidades. (O contrabando) é terrível para uma economia quando você mitiga o desenvolvimento e a inovação. Precisamos avançar no combate a essas fraudes”, disse.
No segundo painel do Correio Debate, o procurador do Distrito Federal, Eduardo Muniz, mencionou um dos principais desafios para melhorar o sucesso das apreensões e contenção do contrabando: o tamanho das fronteiras do Brasil comparado ao efetivo de segurança. São mais de 16 mil quilômetros que precisam ser vistoriados pela Receita Federal e Polícia Rodoviária Federal. Estima-se que apenas um em cada dez produto ilegal é apreendido na entrada do país.
“Temos o Paraguai, Equador e Bolívia mirando todo o seu mercado para o consumidor brasileiro. Não se trata de pequeno contrabandista, são verdadeiros cartéis que operam na produção do contrabando e do produto falsificado”, ressaltou Muniz.
Wagner Ferreira da Silva, secretário executivo de Segurança Pública do Mato Grosso do Sul, estado que faz divisa com o Paraguai, também contribuiu para a discussão de como enfrentar o contrabando na raiz. O secretário acredita que apreensão não deve ser o único foco da política de combate ao mercado ilegal.
“Se olharmos o crime de contrabando simplesmente do aspecto aduaneiro, não vamos enxergar o que ele realmente representa para a sociedade e comunidade. Ele é muito mais impactante, porque sustenta uma cadeia criminosa que é financiada e vive dessa prática criminosa”, pontuou o secretário.
No campo da repressão, Ferreira acredita que somente as operações policiais não são mais suficientes para coibir o crime, porque as quadrilhas têm visto o quão lucrativa é a atividade ilegal e diversificando as atividades, apostando em logística para o contrabando, por exemplo.
“Enxergando o contrabando como é não podemos tratar um crime complexo de forma simplória. Não vamos resolver esse problema simplesmente com repressão policial. Temos que trabalhar em diversas vertentes, temos que tornar o nosso território economicamente inviável para a prática desse crime”, afirmou.
Acompanhe como foi o seminário no perfil do Correio Braziliense no Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=VZqxcxG-RqM
“O mercado ilegal no Brasil cresce por conta do preço, em consequência da alta tributação, que só incentiva a ilegalidade”, explica o presidente do Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade.
Segundo o presidente do Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP), uma tributação excessiva do novo Imposto Seletivo, previsto na regulamentação da reforma tributária, pode estimular o mercado de produtos ilegais